Escambo, block chain, bancos e operadoras de cartão

Desde que o Helder postou no facebook uma foto da primeira compra de supermercado que ele fez em Campinas usando bitcoin eu retomei meu interesse pelo tema de redes de pagamentos alternativas.

No caso dele, a compra de supermercado foi possibilitada por uma iniciativa chamada BitBairro, que nada mais é que uma rede de escambos (ou feira ponta-a-ponta como ele descreve), um grupo de Whatsapp de pessoas do mesmo bairro, que combinam caronas e compras de supermercados entre si e usam o block chain como se fosse um banco para contabilizar as transações.

Block o quê? Como assim?

Tentando explicar melhor, no caso da rede de bairro acima, imagine um grupo de amigos que se ajudam e documentam suas dívidas em um livro, sempre que alguém quer pagar por um favor, posta no chat a palavra "transferi" seguido da quantia e do destinatário. Só que ao invés de depositar o dinheiro na conta bancária do amigo, "transferir" significa apenas anotar isso num livro (cada participante do grupo mantém uma cópia atualizada deste livro):

Alice:  
— Estou na padaria, alguém precisa de algo?

Bob:  
— Opa, tem como me trazer pão e leite?

Alice:  
— Claro, anota lá no nosso "prego" que você me deve 6 filões e um semi-desnatado Italac, a conta deu R$ 12,60

Bob:  
— Beleza, "transferi" R$12,60 para a conta da Alice

Caio:  
— Anotei aqui no meu livro.

Daniela:  
— "Transferiu" mesmo, anotei também.

Alice:  
— Jóia, anotei também no meu e acredito na "confirmação" do Caio e da Dani, deixarei a encomenda na portaria do seu prédio

Bob:  
— Lindo! Vamos marcar um pebolim esta semana?

Se em outra oportunidade, Bob fizer uma compra de mesmo valor para Alice e ela "transferir" para Bob anotando no livro, nenhum deles precisará de fato depositar dinheiro na conta bancária do outro. Correto?

Bastaria qualquer um ler o seu livro do inicio ao fim para saber quem deve para quem, quem tem saldo em haver, quem está "quites" e etc…

Pois bem, block chain em termos leigos, nada mais é que um livro destes.

Existem várias redes de computadores que fornecem o serviço de manter livros deste tipo de forma eficiente, distribuída, segura e confiável, Bitcoin é a mais famosa delas.

Desconsiderando a inflação, este livro poderia ser usado por décadas sem que intermediários como o Itaú, Banco do Brasil, Bradesco, Caixa, Santander, Paypal, PagSeguro, MasterCard, Cielo, Sodexo, etc se envolvessem (seja cobrando taxas, seja monitorando o seu perfil de compras) e sem que o governo da vez vigiasse a vida dos participantes e tomasse dinheiro do grupo através de impostos e tarifas.

Muita gente quando ouve falar de bitcoin pensa apenas em uma moeda alternativa, ou numa commodity financeira, num investimento. Mas para mim o grande valor desta invenção é ser um sistema bancário alternativo! Gosto muito deste videozinho:

Mais gente deveria estar fazendo o que este povo de Campinas está fazendo… No caso deles, como estão usando bitcoin, cada participante possui um aplicativo para anotar e conferir transações, apps deste tipo são chamadas wallets ou "carteiras" (a recomendação que ele dá é a Copay, mas existem uma série de outras opções).

Estas carteiras são como cartões de crédito pré-pagos você tem um saldo e a partir daí envia ou recebe parte deste saldo para outras carteiras (basta ter o endereço da carteira para onde vai transferir).

Existem 3 maneiras de carregar/botar crédito nestas carteiras, a mais simples delas é comprar bitcoins (ou centavos, ou milésimos, ou milionésimos de biticoins) de quem já tem. Abaixo listo alguns sites que facilitam esta intermediação de botar em contato quem quer trocar moeda nativa(R$) por frações de bitcoin e vice-versa:

Apesar de ser a maneira mais rápida, é também a mais arriscada pois envolve um depósito na conta do site, o que requer muita confiança. A recomendação geral é não manter dinheiro nestes sites por mais de um dia, ou manter pelo menor tempo possível, usá-los somente para fazer a conversão e depois sacar tudo para uma carteira local sua. E nunca lidar com quantias altas (sempre assuma que o site pode morrer sem aviso ou te roubar na maldade e você perder tudo o que depositou, casos de sites que somem com dinheiro dos usuários sem explicações infelizmente existem).

A segunda maneira é trocar produtos ou serviços por bitcoin, eu por exemplo estou trocando gravatas-borboletas artesanais pelo o equivalente em bitcoins do preço delas:

A photo posted by Fabricio C Zuardi (@fczuardi) on

A photo posted by Fabricio C Zuardi (@fczuardi) on


A terceira maneira é "minerar" moedas. Mining ou hashing em linhas gerais é o ato de contribuir com o funcionamento desta rede bancária alternativa, é colocar máquinas suas para trabalhar atualizando a block chain, os que fazem isto são recompensados com dinheiro de taxas de transação que os usuários podem optar por pagar e também, eventualmente, com um prêmio: uma nova moeda, uma moeda virgem não-gasta, chamada de moeda-base que é introduzida no sistema de tempos em tempos e sorteada entre os que ajudaram a fazer os cálculos que mantém o sistema vivo. É a forma mais difícil e que menos vale a pena.

Em um post futuro pretendo discutir outros casos de gente que já utiliza estas redes de pagamentos e idéias de como aumentar o uso delas, seja entre cidadãos (já imaginou pagar contas sem brigar com o Java?) ou seja entre comerciantes e estabelecimentos brasileiros (já imaginou ter uma "maquininha de cartão" que funciona e não cobra mensalidade/porcentagem das vendas?). Se quiserem se adiantar na discussão usem a caixa de comentários abaixo :)

Foto: Wonderful Artwork by Renee, on Flickr


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Fabricio Campos Zuardi

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