Ônibus Hacker em Brasília
Eu sou um cara bem perdido na vida, ja passei dos 30 e ainda vivo sem rumo, não encontrei uma vocação única, muito possivelmente sofro daquilo que chamam déficit de atenção, tenho experiência em algumas áreas da computação, me entendo como artista, estudo música mas ainda não amadureci a disciplina necessária para ser um músico, gosto de criar coisas e sou muito curioso, desde sempre.
Sobre ADHD, um trecho do artigo linkado acima:
Recent neuroscience research shows that people with A.D.H.D. are actually hard-wired for novelty-seeking — a trait that had, until relatively recently, a distinct evolutionary advantage. Compared with the rest of us, they have sluggish and underfed brain reward circuits, so much of everyday life feels routine and understimulating.
To compensate, they are drawn to new and exciting experiences and get famously impatient and restless with the regimented structure that characterizes our modern world. In short, people with A.D.H.D. may not have a disease, so much as a set of behavioral traits that don’t match the expectations of our contemporary culture.
Voltando…
Tive a felicidade de ter me envolvido, ainda que de forma pequena, com o projeto do Ônibus Hacker, que é um ônibus, um laboratório, uma rede de gente estranha, uma escola móvel, uma bolha de escape da realidade, uma zona de criatividade, uma idéia errada, um risco de vida permanente, uma provocação sobre rodas, uma perua hippie deslocada no tempo ou um foco de resistência humana de um futuro cyberpunk também deslocado no tempo.
É um projeto atípico, um veículo clássico (mercedão O371 ano 89) com algumas adaptações elétricas e estéticas, comprado por uma galera, mantido por voluntários, que sobrevive do dinheiro de cachês cobrados para a participação em eventos (de tecnologia, autonomia, política, arte), tem base em São Paulo, e é discutido via lista de emails pública.
Cada viagem do ônibus é uma surpresa, quem embarca e quais atividades são propostas é algo definido dinâmica e abertamente através de chamadas públicas online.
Viajar com o ônibus é algo que me atrai. Não pelo conforto, segurança e bom planejamento… mas pelo contrário disso. Fazer parte de uma viagem me agrada justamente pelo caos, pelo desconforto, pelo inesperado, pelo imprevisível.
Embarcar é ter que dividir o mesmo espaço, por 15, 20, 30 horas ou mais, com pessoas de idéias, crenças e formações diferentes, é exercitar a tolerância, é permitir-se deparar com o estranho, é adentrar o desconhecido, é dar chance ao acaso e quem sabe dar origem a algo novo a partir disso, novos projetos ou mesmo novas amizades.
Muito bem, o ônibus foi convidado para participar como suporte em um evento de 3 dias em Brasília promovido pelo Laboratório Hacker da Câmara dos Deputados, um espaço também atípico até onde sei, com a proposta de ser aberto e com gente de idéias novas. O evento era um Hackathon com tema "Gênero e cidadania".
Eu não sou mulher, não sou transsexual, não sou gay, não me considero feminista, não sou dos que dizem "todas e todos" ou que escrevem "todxs"… eu não me ofendi com a camiseta do cientista que ajudou a pousar uma sonda em um cometa, não sou de esquerda e nem eleitor do PSOL… acredito que um feto de 12 semanas é mais que um amontoado de acém moído, enfim… por mais que eu aprecie hackatonas, hack-days, tenha no currículo a participação como monitor em duas RodAdas Hacker, e apoie iniciativas de abertura de canais e espaços na câmara dos deputados e outras partes do governo, eu talvez não fosse muito o público alvo do evento.
Ainda assim, este ano eu praticamente não viajara com o busão e ter a oportunidade de pegar a estrada foi mais que motivo suficiente para eu diminuir o volume dos meus preconceitos e pular para fora da zona de conforto mais uma vez.
O que fiz por lá
Quem acompanha este blog ou meu instagram ja deve saber que ando numa fase de costura e trabalhos em pano, fazendo babador, carteira, bolsinhas e até um kilt (que causou estranhamento no congresso, mas esta é outra história). Nesta pegada eu fui massageando a mente sobre o que eu poderia oferecer lá em brasília, além do meu expertise técnico para eventuais grupos competindo aos quais eu me identificasse e quisesse ajudar.
Nos dias anteriores à viagem eu ja estava com o radar ligado para captar links e assuntos relacionados a gênero, um dos links que apareceram na minha frente neste período, via twitter da Angelina Fabbro, foi este sobre coisas que homens de TI fazem sem intenção e que podem ser consideradas sexistas, não entrarei no mérito do post, da lista ou de cada um dos ítens, não é sobre isto que quero falar, o fato é que no ítem 9 desta lista algo me chamou a atenção, a questão do swag (brindes) das conferências de TI, mais especificamente um link sobre as camisetas de corte reto ou "unissex".
Entre as traquitanas que viajaram desta vez com Ônibus Hacker, estavam também materiais de costura: máquina, ferro de passar, tesouras, retalhos, agulhas, linhas, base para corte etc… Montar o circo e tentar hackear os brindes pareceu uma idéia daquelas que tem a cara das oficinas nossas, foi o que eu tentei propor.
Com a ajuda de muitos, incluindo a Raquel, Kamila, Daniela, Fernanda, Maraiza, Vítor, Maira, Raul e Cristiano Ferri. Conseguimos organizar uma bagunça razoavelmente produtiva e copiamos alguns modelos e idéias de projetos de "refashion" que eu pude coletar pelo Pinterest, abaixo uma lista das inspirações seguidas de fotos das nossas implementações:
1: http://nichoward.typepad.com/my_weblog/2013/03/t-shirt-restyling-the-pinterest-way-again.html
2: http://www.instructables.com/id/FASTEST-RECYCLED-T-SHIRT-TOTE-BAG/
3: http://www.andreasteed.com/node/1266/
4: http://www.trashtocouture.com/2011/12/dolman-tee-better-directions.html e
5: http://matsutakeblog.blogspot.com.br/2010/01/waiting.html
6: http://rabbitfoodformybunnyteeth.com/diy-workout-shirt/
Hackear é também ressignificar, uma boa hackathona deve aspirar sempre ir além da mera maratona de programação com grupos pré-definidos, projetos pré-submetidos e um ambiente competitivo sem muitas trocas, é interessante prever na agenda sempre que possível oportunidades para sinergia e ignições criativas (dica: álcool ajuda), projetos que não se encaixem em nenhuma das categorias previstas, projetos criados de última hora, não inscritos ou que subvertam as regras devem ser bem recebidos ainda que não concorram a nada
Oferecer comida, mesas e rede em troca de "apps" é um modelo limitado e um tanto desgastado na minha humilde opinião. Neste aspecto, acho que a participação minha, como membro do Ônibus Hacker foi também no sentido de ajudar a expandir o modelo, não sei se era o esperado por parte dos que nos convidaram, eu sei que me diverti muito! :)